“Vivemos num mundo onde não fazemos o que queremos fazer, mas sim o que a convenção humana convencionou. Somos obrigados a fazer o que o Estado manda. Vivemos num mundo onde, se não temos nada somos marginalizados, somos olhados com olhares desprezantes, somos olhados de soslaio. Vivemos num mundo que, se temos algo, sobretudo monetário, somos babados, bajulados, estereotipados e, mormente, idolatrados” ANDERSON COSTA

domingo, 23 de janeiro de 2011

Pensamento Avulso


O tempo está em chamas, totalmente consumido pelo tedioso ornamento da onomatopeia em tique-taque, evaporando-se nas putrefatas matérias de milhares de cadáveres clandestinos, por aí à deriva de toda a substância, de todas as responsabilidades do desespero-fraqueza kierkegaardiano. Ainda há quem não veja o retumbar insolente de tudo que já foi ensinado, da ciência que se fez edificada. Mesmo quando não me convém, irei elucidar o que se deixa elucidar-se, irei chorar no meu próprio funeral, irei cuspir onde os olhos não alcançam, irei amarrar os ossos à fome mundial. Irei fazer tudo isso sem me ater a escapulários, a rosários, a procissões, a promessas. Se for pra cair, quedar-me-mei no cinza das minhas borradas pinturas, sem o belo arco-íris das demais vidas, sem a conta bancária que enseja as máscaras risonhas. Para alguns resta somente a reza, para outros a oração. Para mim resta a consolação de saber que há algo após meu findar, algo melhor que tudo isso, algo que não se move no respaldo estereótipo, algo que não chora por não ter que sorrir.

Mensagem

Que esse ano de 2011 não seja somente um ano em que todos dizem que irão mudar, mas que a mudança exista e se consubstancie. Alguns dizem: esse ano eu irei fazer isso e irei fazer aquilo. Alguns fazem, outros continuam na mesma redundância, e com isso, e com a soberania democrática, faz-nos caminhar de mãos dadas ao trivial, ao costumeiro e ao sofrimento.

Peço a você que quando estragares um prato de comida, ou reclamar um almoço que não é do seu desejo, peço, repito, que pensem nas criancinhas “vazias” que moram sob as belas suítes em palafitas, vazias de qualquer ambição, de qualquer ideologia, mas cheia de fome e muitas de revolta.
É um favor que peço a todos que desejam uma mudança nesse ano de 2011. Espero que o individualismo se deteriore dando ensejo à fraternidade. Espero que Deus, em detrimento do fanatismo ao dinheiro, se torne o centro de todas as pessoas.
Até quando reclamaremos às paredes? Até quando procuraremos alguém para atribuir-lhe a culpa por toda esta situação, ao invés de irmos à luta?
Até quando seremos o vaso sanitário do sistema bicameral federativo?
Até quando os “mandões” jogarão suas fedentinas fezes sobre as nossas cabeças, fazendo-nos engulhar?
Até quando? Quando iremos nos conscientizar e pararmos de apertar o cinto na barriga?
A mudança está em nossas mãos. É dia de luta. É ano de luta. Hoje e sempre! Mas como, se as quintas, sextas, sábados e domingos é dia de cerveja? Como? Com tanta comodidão não haverá mudança alguma, todavia sim o devido fincamento já existente, e assim tudo ficará como está. Amém. É isso?
Quereis que a penúria e a fome consolem nosso cotidiano em demasia?
Quereis matar a sede nas lágrimas infantis?
Quereis o ósculo da miséria como colibri na antemanhã?
Claro que ninguém quer isso! Eu, assim como você, penso somente no futuro e esqueço que a vida é o agora e que somente a luta há de aliviar muitas dores. Vivamos o agora, pois o amanhã pode inexistir. Um feliz ano novo. Um feliz 2011 para todos. Amo a todos e continuarei sendo um “fazedor de besteiras”. Sempre fazendo besteiras para beneficiar o meu próximo. Serei um eterno sonhador. Olharei sempre para o céu, para as estrelas, para o sol e os terei como exemplo de disciplina e grandiosidade. Olharei sempre para um mendigo e continuarei a chorar saudades da fraternidade. Olharei sempre para você e te quererei grande. Abraço a todos.

sábado, 22 de janeiro de 2011

I Have a dream

As crianças pedem o HABEAS CORPUS, o desagrilhoamento, o veredicto positivo e a viável e prometida carta de alforria. Elas sonham com a esperança de um dia serem soltas da prisão onde a fome é alastrante, queimando-as internamente o suco gástrico da infelicidade, marginalizando-as a educação peneirada. É de se imaginar a sensibilidade, a moral administrativa de um Deputado Federal que, ao invés de beneficiar a evolução educativa, moral e em todos os aspectos das crianças, compra uma lancha com o seu primeiro salário. É de se admirar a sensibilidade de uma prefeitura onde o pêndulo só pesa de um lado, ficando o outro à deriva do que vier. O salário mínimo, ou melhor, o salário ínfimo aumentou somente 35 reais. Talvez fosse melhor se o aumento fosse de quase 10 mil. Mas já houve o reajuste dos semideuses, tirando muito dinheiro que seria destinado à educação já desgastada, à saúde já enferma, à infra-estrutura afundada, às suítes-palafitas, aos esgotos em que nadamos. Admiro-me dos que conseguem tirar do salário ínfimo o oxigênio necessário à sobrevivência. O povo brasileiro é lutador, é estrategista, pois sabe como se virar com um grão de dinheiro, sabe encher o “bucho” com a farinha e a água, sabe admirar a discriminação de se comer um ovo com o arroz e o feijão, é resignado e não sonha com o Escargot num prato à hora do almoço, mas somente com escargot de uma vida melhor. Muita força ao povo. Que a honestidade em nós seja maior do que a pigmentação fétida de qualquer congresso.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Já quis

Já sonhei demais, já quis ser rico, já quis almoçar numa imensa mesa de fartura com os meus irmãos mendigos, famintos, já quis ser político para acabar com a discriminação empregatícia, com o desprezo que se é dado a algumas profissões, com o olhar de desdém que se é voltado para uma determinada classe. Já quis viver somente para a leitura, já quis até ser poeta, já quis dá valor ao que não é mais valorizado, já quis ouvir Mozart enquanto outros ouviam um tal de arrocha. Já quis acordar tarde, sem preocupação de qualquer ofício. Já quis fazer reivindicações, já quis fazer a lei valer. Já quis aprender como o Charlie Chaplin aprendeu, lutar como lutou Martin Luther King, vencer como venceu Zumbi dos Palmares, fazer os fins justificar os meios como o fez Maquiavel, já quis ter um pouco da arrogância do Bonaparte, deixar de ouvir baboseiras e ficar surdo qual ficou Beethoven. Já quis largar de estudar, de decorar, de ter que me preocupar com a forma de ganhar dinheiro, já quis poder dá cem reais a um catador de lixo, destituir os poderosos do poder, destronar o Sarney, viver como o Chico Mendes, ganhar dinheiro como Bill Gates, profetizar como Jesus Cristo, aprender como um aluno comportado. Já quis e quero ainda muitas coisas. Mas, de chofre, o que quero é sonhar com dias melhores. Com menos famintos espalhados, com o fim da concentração de renda e, sobretudo, com o fim da segregação.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Algo vernáculo

Na cidade onde moro há ruas como nas demais cidades dos demais países. Citar-lhos-ei algumas das ruas que por aqui persistem: uma delas, onde moro, nem rua é, mas a considero como tal. É a chamada Travessa do Portinho, cheia de mexericagem e de músicas de má qualidade, umas iguarias musicais tidas como arte, uns berros de proveniência interiorana e etc. As pessoas residentes nessa travessa foram exclusivamente selecionadas por um não sei o quê de sensibilidade malévola. Há desde cachaceiro à homoafetivo, todos agrupados na coluna vertebral da Travessa do Portinho-Centro. Há a Rua da Palma que se estende desde o consumir dos viciados até a nobreza puritana do bairro. Pode-se acreditar nisso? Tanta bipolaridade numa mesma rua? De um lado o povo, os camponeses. Do outro a nobreza feudal, os semideuses.
No fim desta mesma rua há ainda eflúvios de uma nova invasão holandesa, de uma nova saqueação à Bizantina Igreja do Desterro, sem contar que todos os residentes deste setor têm direito aos espólios do Marquês de Pombal, desde as nossas pigmentações à identidade cultural, sem falar das donas cicranas que se sentam às portas na expectativa de uma novidade, de uma maledicência.
Outra curiosa rua é a de Afonso Pena, resumida somente numa ladeira, desde o céu ao “inferninho”, lugar este de muitas extravagâncias, da concentração de bêbados cantores, de prostitutas assíduas, dos fregueses emancipados e das cachimbadas dos usuários. Imagine só a riqueza que possui tal rua? É algo que lembra os arredores de um Éden enxovalhado com os seus sisudos farofeiros da Ponta D’areia.
Uma curiosidade que sempre tive em relação à cidade onde moro, São Luís do Maranhão, que perdeu tal nomeação para a “Terra do Sarney”, é o porquê das nomeações de pessoas ainda vivas às ruas, praças, pontes, bairros, avenidas e etc. Parece-me, salvo engano, que tal viabilidade só poderia ocorrer após a morte do sujeito. Mas, falando como a juventude da internet, deixemos em OFF o ON da situação. Só não posso deixar em OFF é a natação praticada pelos sacos de lixo e ratazanas lá pelo lado do Mercado Central quando há qualquer evidência de forte chuva, todos ficando ilhados, todos ficando mal-amados, com uma bela vista em cor marrom de uma água empoeirada, metaforicamente. Mas toda essa água imunda não se confunde ao cheirinho de peixe intrínseco à parada de ônibus contígua ao Mercado do Peixe. E esse cheirinho de peixe é algo que não pode acabar, nem mesmo por uma nova emenda constitucional que o tente dizimar. Esse cheiro impregna-me de toda a minha infância, fazendo-me lembrar os tempos em que acordava bem cedinho para ir à escola, em plena puberdade do ensino médio. Era um menino sem nenhuma malícia, salvo a do desejo sexual pelas colegas mais bonitas, o que é comum de todo jovem nessa idade. E ainda hoje quando pego o coletivo na mesma parada, sinto aquele cheirinho de peixe. Esse cheiro que exaspera muitas narinas já se tornou patrimônio cultural da minha humanidade e tenho certeza que de muitas humanidades alheias.